Todos nós temos, em maior ou menor grau de importância, lugares que elegemos como santuários, locais onde gostamos de ir para fazer o que quer que seja – ou mesmo para não fazer nada – e com os quais nos identificamos e sentimos prazer de ali estar. Há quem prefira o apartamento no litoral ou o sítio no interior para fugir do caos cotidiano. Nada mais natural, afinal, a vida em uma cidade como São Paulo pode ser estressante. Mas, às vezes, essa fuga pode ocasionar ainda mais stress.
Em época de festas de fim de ano, carnaval ou feriados prolongados, milhares de pessoas entopem aeroportos e passam horas presas em insuportáveis engarrafamentos para poderem relaxar. Eleva-se o nível de stress justamente pelo pretexto de combatê-lo. Tal qual animais enjaulados que são soltos repentinamente, as massas precipitam-se para praias e campos em nome da diversão, tornando esses lugares inabitáveis.
Felizmente, desse mal não sofro. Quando quero desfrutar de momentos agradáveis em um lugar tranqüilo, basta abrir a porta de casa e sair caminhando pelas ruas do meu bairro. Explico: Nasci e cresci no tradicional bairro da Mooca, o qual, na minha modesta opinião, é um dos melhores e mais calmos lugares para se viver em São Paulo.
Localizada a poucos minutos do Centro de São Paulo, a Mooca mantém um ar típico de cidade do interior, com costumes e linguajar próprios. As pessoas são afáveis, sorridentes e cumprimentam-se na rua – forte influência italiana, predominante no bairro. Aqui o tempo escoa mais devagar, demorando a desprender-se do passado. Apesar da constante construção de prédios, a Mooca ainda é um bairro com grande número de casas, a maioria ainda mantendo estruturas e detalhes de antigas arquiteturas, bem como pequenas ruas e vilas tipicamente européias – algo que me fascina, pois, quem me conhece sabe do meu encanto pela Europa. Além disso, um mooquense sente orgulho em dizer que é morador da Mooca, da mesma forma que um francês orgulha-se ao falar de Paris.
Os moradores do bairro possuem um admirável comportamento conservador, mobilizando-se para preservar locais de importância histórica e obrigando construtoras e incorporadoras a criarem áreas verdes em seus empreendimentos imobiliários, tudo em nome da qualidade de vida. Verdade que esse comportamento pertence aos moradores mais antigos, mas mesmo os jovens mostram um pouco de preocupação com a preservação do bairro. Os mooquenses possuem um forte apego à família, dão valor às tradições e não se sentem confortáveis com mudanças muito drásticas.
Em questão de infra-estrutura, somos bem servidos de colégios, faculdades e hospitais, além de feiras-livres, teatro, bibliotecas, clubes e, mais recentemente, um shopping center (novidade por aqui!). Praças, não há tantas, mas o mooquense encontra seu dolce far niente junto à área verde do Parque Distrital da Mooca, que abriga o prédio da subprefeitura, e – claro – entre as muitas árvores do famoso clube Juventus.
Nos finais de semana, os moradores da Mooca costumam entregar-se aos prazeres que o bairro oferece. Nas ensolaradas manhãs de sábado é praticamente obrigação tomar café fora de casa. Se quiser um lugar calmo, recomendo o Frans Café, na Rua Chamantá. Gosto dali por ser mais vazio pela manhã. É lugar pra ir sem pressa. Costumo passar lá sempre que estou desenvolvendo algum trabalho. Escolho a mesa perto da janela, peço um pão tostado com manteiga e uma xícara de café, abro meu caderno e fico rabiscando projetos.
Para um café mais movimentado, opções não faltam. Você não errará ao escolher padarias famosas, em especial a Monte Líbano, na Av. Paes de Barros, e confeitaria Nova Veredas, na rua Juventus, com uma variedade incrível de buffet. A Veredas funciona 24 horas ininterruptamente (mesmo no natal e ano novo) e está sempre lotada, sendo também uma excelente opção para almoço. Pode-se optar, também, pela tradicionalíssima doceira Di Cunto, na Rua Borges de Figueiredo. Com mais de 70 anos de história, a casa oferece o que há de melhor em doces e salgados. Aliás, o balcão de doces é um espetáculo à parte. A Di Cunto está sempre cheia nos finais de semana e é fácil esbarrar com figuras famosas. Certa vez encontrei o ex-governador Fleury entupindo-se de pães recheados. Outro lugar interessante para comer é a Esfiha Juventus, na Rua Visconde de Laguna, casa especializada em cozinha árabe que até pouco tempo se recusava a servir condimentos como ketchup ou mostarda e cujos garçons fazem todas as contas de cabeça – pare no balcão e peça um quibe com catupiry, não tem como errar.
Na janta, os mooquenses são praticamente unânimes: pizza! Nesse quesito, o bairro extrapola: são mais de 100 pizzarias espalhadas por toda a região, desde pequenos deliveries às tradicionais pizzarias do Ângelo e São Pedro, que atraem visitantes de outras regiões de São Paulo. A pizza “baiana” da São Pedro é praticamente obrigatória – eu bem que tento experimentar outros sabores, mas me sinto um traidor se passar lá e não pedir essa pizza.
E são por esses e outros motivos que, quando todo mundo resolve viajar, prefiro ficar por aqui, curtindo meu bairro. Nos feriados é até melhor, pois as ruas ficam vazias e logo cedo você pode desfrutar de um silêncio reconfortante. Se fechar os olhos e prestar atenção, é possível escutar um galo cantando no quintal de alguma casa e você achará que acordou em uma cidade do interior. Confesso que, durante a semana, quando saio para trabalhar logo cedo, bate uma melancolia por deixar para trás as ruas conhecidas e me aventurar lá fora, na selva de pedra.
Não me entendam mal. Não sou contra viagens, pelo contrário, adoro conhecer novos lugares. Mas entre passar horas enlatado em um engarrafamento e tomar um sorvete com minha esposa enquanto deslizamos silenciosamente pelas ruas da Mooca num final de tarde aconchegante, fico com a segunda opção. Afinal, sempre se pode viajar fora de temporadas.
Em 2005 meu bairro fez 450 anos. Devo registrar aqui um mea culpa, pois, mooquense sendo, estive ausente a esse acontecimento. Uma falha que pretendo remediar de agora em diante, estando mais presente nas atividades do bairro. A criação deste espaço na Internet dedicado à Mooca foi o primeiro passo para expressar meus sentimentos em relação a esta região e oferecer aos leitores um meio de interagir com outras pessoas que partilham da mesma opinião.
Há quem diga que só os mooquenses natos conseguem entender essa paixão pelo bairro. Pode ser, mas, se assim fosse, não veríamos tantas construções em ritmo acelerado e tanta gente querendo desesperadamente se mudar para cá, em busca de qualidade de vida. É provável que outras pessoas tenham esse sentimento em relação aos seus respectivos bairros, mas, honestamente, ainda não conheci nenhuma.
Se você, leitor, assim como eu, nasceu e cresceu na Mooca, então este texto reflete boa parte de seus pensamentos. Somos uma família de 63 mil habitantes em uma área de 7,7 km², assim, cedo ou tarde acabamos nos esbarrando. Sinta-se desde já convidado para um café e um pouco de parolagem. Brindemos ao bairro.
Mas, se você não conhece a Mooca e acha que eu exagero nas palavras, convido-o também não só para o café, mas para um passeio por nostálgicas ruas do passado. Venha conhecer os lugares citados neste texto, a hospitalidade dos mooquenses e vamos saborear ótimas pizzas juntos. Venha, e você será recebido de braços abertos.
Fotos: Jornal da Mooca, Portal da Mooca, Diário do Comércio
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Emilio,
Como frequentador da Mooca desde meados dos anos 80, eu sei do que você está falando e compartilho desse sentimento, um bairro nostálgico. tranquilo, de boa gente e que sempre se tem um prazer enorme em desfrutar de suas peculiaridades.
Parabéns pela iniciativa de homenagear esse bairro, que apesar de não ser o meu, sempre que estou aí me sinto em casa.
Olha só, existe algo que vc não comentou.... Um bar temático chamado VILAREJO SÃO PAULO - Uma deliciosa mistura de casa notura, bar e museu do automovel... Parabens pelo texto!
Emílio,
Gostei muito do que escreveu sobre a nossa Mooca! Cada vez mais me orgulho de viver aqui...
Tem gente que acha um exagero o amor que temos pelo bairro! Mas só vivendo aqui pra saber!
Fiquei sabendo do seu blog por um acaso. E olha que somos da mesma família!
Po cara... sou do Nes Archive - Luks-Krow[JF].
Texto excelente esse ae. Ainda não conheço São Paulo, mas quando for visitar farei questão de conhecer o bairro da Mooca, que com todos os detalhes do texto parece mesmo ser o paraiso.
abraços,
Olá Emílio,
Adorei tudo o que vc escreveu, e apesar de minha pouca idade jah tenho todo esse sentimento q vc tbm tem pela mooca...
=]
Emilio, Endosso tudo o que você disse á respeito da nossa querida Moóca , que deve ser respeitada como um bairro que não deve nada á nenhum outro , tudo temos aqui ,é uma pena queo pessoal tradicional esteja acabando , devido á idade e a modernidade que dá lugar aos edifícios em lugar das casas ensolaradas, com seus pomares que a molecada não exitava em desbravar levando carreira e até chumbinho de seus proprietários .Tudo isso pertence á um passado que quem viveu deve estar com uma saudade imensa , principalmente dos longos papos com as cadeiras na calçada , cumprimentando um e outro que passava . Bons tempos aqueles que se podia sentar na porta de casa até altas horas , no veráo ,e nas festas juninas as fogueiras que cada um fazia e chamava os vizinhos , para um quentão , batata doce , pipoca...É ...bons tempos ! Mas agora a sua geração vai criar um cenário novo , e escrever novas histórias ,dando continuidade assim á uma Moóca rejuvenecida e cheia de sonhos . Um sentimento que se Deus quizer, nunca se esgotará !
Calil. Parabéns pela obra on line que está criando para nossa geração. Realmente tem muita história boa e interessante para serem contadas e relembradas. Mas, infelizmente não é apenas isso. A Mooca deixou de ser aquele bairro tranqüilo de 10 anos atrás. Existem ruas que já possuem a má fama de inseguras e perigosas. Rua Guia Lopes há poucos dias atrás teve uma casa invadida por bandidos e acabaram atirando em testemunhas que estavam em outra casa com fundos para a rua Pedro de Lucena. Rua esta que na mesma semana teve um furto com invasão e ocorrência registrada no 18º DP. Só na rua Pedro de Lucena, no período de 60 dias, houveram 4 arrombamentos de veículos, 1 tentativa de roubo e 1 veículo roubado. Exatamente no cenário que ilustrou a manchete da revista Veja São Paulo como exemplo de lugar tranqüilo.A Mooca está sendo vendida por seus herdeiros e está sendo invadida por forasteiros. Infelizmente os bons tempos ficaram para trás.
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