Categorias: Cotidiano

Momentos Nostálgicos

Publiquei este texto numa quinta-feira, 02 de dezembro de 2004, em meu antigo blog:

Nostalgia:

do Gr. nostós, regresso + álgos, dor

s. f.,

melancolia, abatimento profundo de tristeza, causado pelas saudades do lar ou da pátria.

Recentemente fui acometido por um forte sentimento saudosista. Talvez, com a proximidade do fim do ano, minha mente resolveu fazer uma retrospectiva involuntária. E a comparação com os anos passados é inevitável, especialmente aquela época de “parasita” em que minhas maiores preocupações eram estudar para a prova de matemática, passar a tarde em frente à TV e correr até à banca de jornal em busca do último número da Liga da Justiça. Bons tempos.

Ah, a nostalgia! Sentimento único. Evoca tanto alegria quanto tristeza e, quando não, ambos. Num momento lembramos da infância, dos brinquedos, dos amigos, do primeiro beijo, das festas de aniversário, das cores, sons e odores que povoaram nosso passado. No instante seguinte, essas mesmas lembranças trazem, inevitavelmente, as decepções, as separações, as perdas, as pessoas que se foram e os erros que não podem mais ser corrigidos. Lembrar é, na melhor das descrições, uma via de mão dupla – se por um lado anda a alegria, pelo outro vai a tristeza. Não me queixo, erros e acertos fazem parte do amadurecimento.

Sou muito apegado ao meu passado, mas não cometo o erro de viver nele. Guardo um carinho especial pela minha infância e adolescência, procurando, sempre que possível, relembrar certos momentos que me foram marcantes. Parte do meu interesse em colecionar brinquedos e videogames se deve à vontade de preservar a chama da juventude. Envelhecer não significa tornar-se uma pessoa amarga, preocupada ou mal-humorada. Sejamos como crianças crescidas, cumprindo com nossas responsabilidades, porém, mantendo a capacidade de nos maravilharmos com pequenas coisas e rirmos de tolices. Continuemos inocentes, mas não ingênuos.

Volta e meia recebo e-mails nostálgicos, daqueles com listas de objetos, programas de TV, brinquedos e guloseimas referentes às décadas de 80 e 90. Leio sem pressa e surpreendo-me ao reconhecer cada item. Se por um lado é assustador (estou ficando velho!), por outro é gratificante, pois, sei que aproveitei bem minha era de ouro. Não vivi minha infância ‘na rua’, jogando taco, futebol ou fazendo travessuras, escolhi a sala da minha casa como o centro do meu entretenimento. Tenho certeza de que aqueles que viveram sua juventude mais ‘intensamente’ aproveitaram-na melhor do que eu e têm mais histórias para contar. Não me arrependo. Dentro do que me propus, tenho ótimas recordações.

Mas devo confessar que sinto saudades de certas épocas. A primeira metade da década de 90, por exemplo, foi excelente. Não por coincidência, essa foi a época em que mais joguei videogame com os amigos. Vivenciamos o surgimento de jogos e aparelhos que fizeram história. Andávamos de uma ponta a outra do bairro, debaixo de sol escaldante, apenas para conferir os “últimos lançamentos” nas locadoras. Vibrávamos com as fotos das revistas especializadas e passávamos tardes explorando mundos alienígenas, salvando princesas em castelos, derrotando vampiros ou disputando o primeiro lugar em rallys pelo deserto. Tudo isso regado a salgadinhos, guaranás e bolachas waffle cobertas com chocolate. Apesar de não muito numerosos, éramos bastante unidos. Gostávamos das mesmas coisas e aproveitávamos o máximo que a diversão eletrônica nos proporcionava.

Hoje são poucos aqueles que lembram com saudade daquela época. Muitos encontraram a diversão em outros “prazeres” que o mundo lhes ofereceu. Alguns tentam esgotar sozinhos todo o estoque de bebidas do planeta, enquanto outros procuram colecionar mais mulheres do que os haréns dos antigos sheiks persas. Não os condeno. Evoluíram com o tempo, ao passo que eu andei mais devagar. Como disse antes, não vivo no passado, mas levo mais tempo para chegar ao presente. Certos valores, para mim, continuam importando mais do que uma “balada”.

A minha coleção de videogames está lá: dez aparelhos e quase trezentos jogos. Tenho pouquíssimo tempo para desfrutar de tudo isso. A vida de “adulto” exige certas responsabilidades com os compromissos – não podemos mais implorar aos professores aquele “meio ponto” para passar de ano, dependemos apenas de nós mesmos, agora. Ainda assim, sonho com um dia em que poderei reunir os velhos amigos novamente, bem como os novos, para passarmos o dia inteiro (e, quem sabe, virar a madrugada) em frente à TV, com os antigos videogames ligados outra vez. Tentaremos, então, terminar aqueles jogos que não foram terminados, descobriremos segredos que não foram descobertos e enfrentaremos inimigos que não foram enfrentados. Tudo isso em meio a pizzas, salgadinhos, refrigerantes e, é claro, bolachas waffle cobertas de chocolate.

Lembraremos, então, daquela época em que o mundo era mais simples, onde nossos sonhos não tinham limites e o futuro parecia menos incerto. Por um dia, ou algumas horas, que sejam, voltaremos a ser aqueles moleques despreocupados de antes, procurando apenas uma diversão desinteressada, esquecendo o “mundo cruel” lá fora. Faremos isso não por causa dos videogames, mas pelo sentimento de amizade que ainda temos e, obviamente, pela nostalgia.

O que mudou?
Lembrei-me desse texto dias atrás e resolvi conferir o que mudou em seis anos. A sensação de nostalgia ainda existe, mas é muito menor. A coleção de videogames se foi – vendi tudo há uns dois meses. Percebi que os jogos e aparelhos continuariam ali, nas caixas, esperando eternamente para serem usados. Desfiz-me dos jogos, mas não do amor por videogames, bem entendido. Afinal, sempre se pode jogar no computador ou na casa de amigos. Além disso, pretendo comprar um videogame novo ano que vem – estou me decidindo entre o PS3 e Wii.

E reunir os amigos em casa para jogar ainda continua sendo um problema. Agora que casei, achei que conseguiria planejar melhor meu tempo, mas ainda falta uma melhor organização da minha parte. Os últimos dias têm sido atípicos no trabalho, me fazendo virar madrugadas e trabalhar todo final de semana, então não posso usar esse momento como exemplo de rotina.

Mas tudo o que vai acima, no texto de 2004, é verdade. Com exceção de que me sinto muito menos apegado ao passado. Ou melhor, fiz um ‘upgrade’ nesse sentimento, entendendo melhor a nostalgia a partir da obra Aforismos Para a Sabedoria de Vida, de Arthur Schopenhauer – farei um post específico sobre esse livro do filósofo alemão futuramente.

Mas, se existe algo no meu antigo texto que me incomoda bastante é o fato de ainda não ter encontrado os benditos waffles cobertos de chocolate. Sem eles, nada faz sentido.

Emilio Calil

Empresário, Palestrante e Escritor. ⚡ Fundador do Marketing de Transformação, que emprega técnicas de autoconhecimento e coerência para elevar o espírito de pessoas e empresas.

Ver comentários

  • Foi bom reler o teu texto. Eu também casei, logo comemorarei seis anos, se Deus quizer. Como você posso dizer que continuo nostalgico, mas diferente de você não posso dizer que a sensação é muito menor. Acho que no meu caso a nostalgia é um tipo de transtorno obcessivo compulsivo, até a nostalgia dos outros me afeta. É o caso da venda de seus vídeogames, você ja me explicou o motivo do desapego, compreendi mas não aceitei (eu sei, não importa se eu aceito ou não, afinal o desapego é seu). Mas eu fico imaginando, todos aqueles consoles e jogos originais, aquilo tudo era um tesouro. Sem falar que um dia você vai ser pai e então poderia curtir todos esses games com o herdeiro/a. Ele ou ela teriam a chance de esperimentar (empiricamente) todas aquelas plataformas maravilhosas. Pense nisso. E fique sabendo, quando se é pai o tempo para o lazer aparece.

    Mas tudo bem. Cá continuo eu, nostalgico ao extremo, tanto que minha esposa vive me trazendo para a vida real quando começo a conversar com ela sobre o passado, ela também é nostalgica, só que mais ponderada.

    Eu ainda sou louco para comprar um Mega Drive e "tendinitar" mãos e punhos jogando Sonic e Bomberman. Tenho saudades dos quadrinhos da Editora Abril, aqueles no formatinho. Outro dia fiquei triste no Playcenter porque não havia mais montanha encantada e um muro aterrador separava toda uma área do parque que não existe mais, senti claustrofobia. Christopher Reeve, eu sei, não vai mais ser o Superman, mas existem os DVDs de vida longa, ainda bem. E os desenhos animados, inventaram o Youtube onde posso ver de Flintstones a He-man, ainda bem, isso alimenta minha nostalgia obcessiva, e assim vou vivendo.

    É isso, eu me alimento de nostalgia, e isso me dá vontade de que o futuro chego logo, porque quando ele passar sei que ficarei com saudades. É um ciclo ininterrupto e empolgante.

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Emilio Calil

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