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Uma noite no Municipal

Nesta quinta-feira dediquei-me a atividade que há tempos estava ensaiando, mas nunca me sobrava tempo. Cedendo ao convite de amigos, fomos ao Teatro Municipal assistir a apresentação do Quarteto de Cordas da Cidade de São Paulo. Experiência magnífica.

Primeiro, pelo próprio Municipal, que enche os olhos. Estou tão acostumado a criticar São Paulo e o Brasil que às vezes esqueço que há coisas belas por aqui, também. O Teatro é lindo e transporta você para outras épocas. A sensação de imaginar as pessoas que já passaram por ali, desde a fundação, em 1911, é mágica. E a história escorre pelas paredes do lugar. Se você nunca foi, vá. Não se arrependerá.

Em segundo, claro, pelo próprio Quarteto, composto por Betina Stegmann (violino), Nelson Rios (violino), Marcelo Jaffé (viola) e Robert Suetholz (violoncelo). Destaque para Betina, que fazia seu violino criar vida de forma tão suave que dava a impressão de sequer encostar o arco nas cordas. Na apresentação, tocaram o Quarteto nº 2 do compositor brasileiro Cesar Guerra-Peixe (1914-1993), contemporâneo de Villa-Lobos (1899-1959), e A Morte e a Donzela, de Franz Schubert (1797-1828). Confesso que não conhecia Guerra-Peixe e como primeira impressão não me agradou. A peça era uma mistura de estilos em alternância constante, chegando quase à cacofonia. Os instrumentos pareciam não se entender. Depois me disseram que essa música não foi composta para ser realmente harmoniosa, mas para incorporar estilos musicais brasileiros a sinfonias e testar a habilidade do músico – é quase um forró com instrumentos clássicos. Mas me garantiram que o compositor tem outras obras belíssimas, “estas sim com harmonia”, disseram, então darei outra chance a Guerra-Peixe qualquer hora.

Mas quando começaram Schubert a diferença foi gritante. Execução impecável, de arrepiar, mesmo. Tocaram quatro movimentos da peça e tudo transcorreu de forma tão suave e integrada que, às vezes, não se percebia a troca de um movimento para outro. Marcelo Jaffé aproveitava as pausas para contar um pouco sobre a vida dos dois compositores em destaque na noite, o que achei excelente, pois dava ao público uma visão geral da época em que eles viveram e do porquê criaram tais obras. Triste foi notar o teatro vazio. Havia bastante gente, sim, mas as cadeiras vazias estavam em maior número. O leitor deve estar pensando que desembolsei uma pequena fortuna lá e, por isso, não é programa para as massas. Bem, esta hora e vinte de música sublime me custou R$ 10. Um ingresso para um jogo de futebol está na faixa dos R$ 20 (R$ 60 os mais caros) e os estádios vivem lotados, portanto preço não é desculpa. E não havia exigência de trajes específicos, ou seja, você podia ir de jeans e camiseta ou de terno – a escolha era sua. Aliás, vi muita molecada de piercing, tatuagem e cabelos esquisitos lá. E, se não me engano, também vi o prefeito Kassab.

Na saída, como nem tudo é perfeito, queríamos ficar conversando um pouco na escadaria do Municipal e aproveitar a brisa refrescante pós-chuva. Infelizmente, a abordagem constante de pedintes e sujeitos embriagados nos forçou a apressar as despedidas. Estávamos no Brasil, apesar de tudo – claro que eu não deixaria escapar essa farpa.

Mas fica a sugestão para um programa de classe, culturalmente rico, emocionante e barato. Afinal, acredito que todos possam abrir mão de R$ 10 uma vez por mês, que seja, para apreciar boa música. Devo voltar lá mais vezes e farei saber os dias. Quem quiser aparecer por lá, já está convidado.

Emilio Calil

Empresário, Palestrante e Escritor. ⚡ Fundador do Marketing de Transformação, que emprega técnicas de autoconhecimento e coerência para elevar o espírito de pessoas e empresas.

Ver comentários

  • Puxa vida Emílio, o Teatro Municipal é maravilhoso mesmo, queria morar lá, hahaha. Acho que eles devem ter programas para visitar o prédio e conhecer toda a construção, inclusive existem os calabouços do Teatro, que vi na TV, com direito até de ser assombrado, hahaha.

    Bom, faz muito tempo que fui lá, ver um amigo cantar, aquele de quem te falei. Mas na época, como estava em inicio de carreira, o papel dele na peça era pequeno, interpretava um soldado. Mas embora pequeno já era muito, afinal, é bom que se comece sempre de baixo, com diz o provérbio "quem ajunta aos poucos amontoa".

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Emilio Calil

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